Nas Colunas de Hércules, ao sul da Península Ibérica, os continentes europeu e africano fazem-se mais próximos, separados por um canal de pouco mais de uma dezena de quilómetros. Aí, entre Ceuta e Gibraltar, as águas do Mediterrâneo lançam-se em comunhão com as do Atlântico. A designação desta passagem estreita bebe no imaginário mitológico da Grécia antiga, por mor de um episódio que narra uma viagem de Hércules por estas paragens. Para realizar o penúltimo dos seus "doze trabalhos", o herói buscou o auxílio do desafortunado Atlas, condenado a expiar na região mais ocidental do norte de África uma rebelião contra Zeus. Tal como contava Hesíodo, o castigo estava à altura da desmedida força do irmão de Prometeu, que assim se viu obrigado “a suportar às costas para sempre / o cruel peso do mundo esmagador / e a abóbada do Céu”.
Estes enredos mitológicos passam, obviamente, ao largo da cultura dos povos que habitam a cadeia montanhosa do Alto e do Médio Atlas, mesmo se o nome das montanhas mais elevadas do norte de África evoca o nome do semideus grego. Os Berberes encontram-se na região há quatro mil anos e, apesar da conversão ao islamismo por volta de finais do século VII, a sua cultura e o seu espírito de independência lograram resistir às sucessivas vagas de invasores, dos romanos aos árabes, passando pelos franceses da época do protectorado. Em 1919, líderes berberes do Rif chegaram a ameaçar seriamente o poder colonial, lançando uma série de ataques contra fortalezas espanholas do norte do território. A resistência dos Berberes face aos Árabes recém-chegados afirmou-se logo com determinação no século VIII, quando aderiram à heresia kharédjita e tentaram expulsar os invasores dos territórios do Magreb. A cidade de Marraquexe, que viria a ar nome ao país, foi fundada, aliás, na sequência de uma rebelião berbere que alastrou rapidamente pelo sul e centro do território e que abriu as portas à primeira grande dinastia da história de Marrocos, a dos Almorávidas.